A saúde pública municipal enfrenta diversos problemas em Caruaru, no Agreste de Pernambuco. Um dos principais é a demora na realização de exames. A dona de casa Terezinha Ernestina preferiu pagar R$ 240 para fazer exames de mama, urina e sangue na rede particular do que esperar três meses para conseguir fazê-los na rede pública. Aguardando em frente ao posto de saúde do bairro Santa Rosa para marcar uma consulta, ela criticou o atendimento. “Tem que ficar aqui esperando a vontade delas, e elas não atendem ninguém direito”, disparou. O ambulante José Joaquim precisou chegar de 5h30 na unidade de saúde para pegar a ficha. Foram três meses para conseguir o exame de coração. Os motivos da demora nunca são informados: “A gente fica indo e voltando, com o tempo resolve”, constatou.
Na zona rural do município, a situação é pior ainda. A empregada doméstica Erivânia dos Santos precisa sair de 3h da madrugada da casa dela, em Lagoa do Paulista, para ir a pé ao posto de saúde da Vila Murici. Mesmo assim, corre o risco de chegar à unidade e não ter vaga, já que as senhas acabam rápido. Apenas oito pessoas são atendidas. “Se for de 7h não pega mais ficha. Não vou arriscar minha vida para ir de madrugada marcar para o dentista”.
A doméstica conta que o posto de saúde do Murici só tem um clínico geral para tudo. O atendimento, segundo ela, só é até 12h e, mesmo marcando na unidade, o exame é feito na cidade. Se optasse pela consulta particular, o valor sairia muito alto: “Eu tiro o dinheiro da minha feira para extrair um dente”. Ela acredita que a construção de um PSF em Lagoa do Paulista seria ideal. “Nós na zona rural somos esquecidos. Para conseguir uma ficha é uma dificuldade. Quando consegue, dá graças a Deus, porque a gente precisa do SUS – Sistema Único de Saúde”.
Atualmente, existem 73 equipes de saúde da família com 73 médicos de saúde da família e quatro centros de saúde com 17 médicos na rede municipal. As equipes de saúde da família atendem as áreas cobertas com PSFs e os centros de saúde atendem as áreas descobertas de PSF. A Secretaria Municipal de Saúde aponta que 71% da população é coberta com atendimento das equipes de estratégia de saúde da família. Segundo a pasta, a zona rural é 100% atendida. A média de pessoas cadastradas pelas ESFs é de 4 mil pessoas.
Além disto, são 499 agentes comunitários de saúde e 220 agentes de controle de endemias, que fazem o trabalho de prevenção e controle de doenças. Da população caruaruense, 79% é coberta pelo programa dos agentes comunitários de saúde.
Membro do Conselho Gestor de Saúde de Caruaru, Carlos Roberto reforça que a realização de exames e a marcação de consultas em algumas especialidades estão entre as maiores dificuldades do município. A cidade cresce, e com ela a demanda por atendimentos na área de saúde: “Por mais que as equipes se empenhem, vai deixar a desejar”. Carlos Roberto aponta também que problemas na rede estadual de saúde acabam refletindo na rede municipal. Uma destas questões está relacionada ao Serviço Móvel de Atendimento de Urgência (Samu), que de acordo com ele não recebe repasses do Governo do Estado. Além disto, faltam materiais e recursos em unidades de saúde.
Planejamento é a chave para melhorar infraestrutura em Caruaru
Uma paciente que não quer ser identificada contou que tenta fazer um procedimento cirúrgico na Casa de Saúde Bom Jesus desde janeiro. A cirurgia plástica para consertar uma pálpebra caída foi marcada através do Ambulatório Multiprofissional Especializado (AME). A cirurgia foi adiada por três vezes com justificativas diferentes. Em um dos casos, ela chegou a ser anestesiada e o procedimento não foi feito.
De acordo com a paciente, um especialista orientou que ela fizesse a cirurgia rápido, pois a ptose pode causar até perda da visão. “Se fosse uma coisa só comigo eu diria: ‘não, é uma falta de sorte minha’, mas eu vi que acontece com muita gente, então é um descaso mesmo”, lamentou. A mulher cobra fiscalizações por parte do poder público. “É um absurdo, um descaso, uma falta de respeito. Todo mundo paga imposto e ninguém está tendo retorno desses impostos. Como é que fica isso aí? O médico recebendo direitinho e a gente sem o serviço”, reivindicou.
O doutor em saúde pública Eudes Lorena avalia que Caruaru ampliou a cobertura de serviços básicos nos últimos anos. O problema é que, mesmo com o crescimento da atenção básica, não houve acompanhamento do crescimento por parte dos serviços de média e alta complexidade. Para ele, entre as melhorias para o atendimento de saúde estão a qualificação das equipes para que estas trabalhem de forma integrada, já que a atenção básica necessita de equipes multiprofissionais.
Inovações tecnológicas tanto para controle interno dos profissionais de saúde como para o atendimento aos pacientes também são apontados. Outras avaliações precisam ser feitas por parte da gestão, já que há um limite de gastos nacional para o orçamento na saúde e em outras áreas. Caruaru gasta, em média, R$ 791.557,16 com a saúde, sendo R$ 492.115,96 com medicamentos e R$ 299.441,20 com produtos para saúde. Em 2018, o município investiu R$ 96.318.470,95, ou seja, 26,73%.
O secretário municipal de Saúde, Francisco Santos, ressalta que as dificuldades na área não são exclusivas de Caruaru, e sim do serviço público de saúde como um todo. Ele reconhece que ainda há dificuldades em dar acesso a algumas especialidades e cirurgias, e diz que houve avanços. “Nosso tempo de espera em boa parte dos procedimentos é um tempo adequado, mas a gente tem vários gargalos. A população se queixa de alguns exames, consultas e procedimentos cirúrgicos e tem razão, a gente tem dificuldade mesmo de oferecer isso”, afirmou.
O secretário aponta que, também considerando a limitação orçamentária, a pasta busca parcerias com o setor privado e as universidades para ampliar os procedimentos realizados pela rede. Perguntado sobre a fiscalização da qualidade do atendimento nas unidades de saúde, o Francisco Santos afirmou que acredita no diálogo com as categorias dos profissionais de saúde e no uso de tecnologias para fazer o controle.
As burocracias e trâmites até os atendimentos propriamente ditos só prejudicam a população que realmente depende da saúde pública. A dona de casa Maria de Lourdes chegou a esperar um ano por um exame do coração. “Os exames demoram muito para sair. Desde o ano passado que tenho a ultrassom da mama para fazer e não saiu ainda”, contou. Para ela, o sistema de saúde ainda precisa melhorar.
O serviço de emergência da cidade é direcionado para hospitais geridos pelo Governo do Estado, que estão superlotados e sem condições para receber mais pacientes. De acordo com o diretor regional do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (Cremepe), Paulo Maciel, para se ter um bom antedimento, Caruaru precisa oferecer de três a seis leitos por cada mil habitantes. Mas a realidade é 1,5 vaga para cada mil habitante, número bem distante do esperado. Considerando que pessoas de outros municípios também são atendidas na rede da Capital do Agreste, o quadro é ainda mais complicado. “A situação da saúde pública em Caruaru continua extremamente caótica. Aconteceu uma melhoria na questão do atendimento municipal, mas está muito aquém da necessidades. A população cresce e a quantidade da assistência não acompanha essa situação”, lamenta.
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